Meu pai casou com minha mãe no ano de 1939, e foi morar na casa do meu avô materno. Era uma casa enorme. Tinha doze quartos, duas varandas, duas salas do meio, duas cozinhas e outras coisas mais.
Ele foi ser o vaqueiro do meu avô. Tomava conta do gado. Tirava o leite todos os dias bem cedinho. Depois disso, entrava para dentro de casa e ia tomar o seu café com leite. Café com leite é modo de dizer.
Era costume do nosso povo naquele tempo tomar o leite com sal. Minha avó paterna fervia o leite com o sal. Ou seja, colocava o sal na panela de leite. Era assim que meu pai gostava. Do jeito que a mãe dele fazia.
Já na casa de minha avó materna, era diferente. Fervia-se o leite sem sal e depois trazia um pouco de sal num pires para cada um colocar na sua vasilha, vasilha mesmo, porque não se tomava leite em xícara ou copo. O leite era servido numa sopeira, e se tomava com uma colher, porque geralmente se misturava com pedaços de batata, mandioca ou abóbora, cozidos.
Meu pai avisou que não gostava do jeito que era feito na casa de minha avó materna, a sogra dele. Ele gostava era do jeito que a mãe dele fazia. Ele não queria que o sal viesse no pires. Ele queria que o sal fosse colocado dentro da panela de leite. Era assim que a mãe dele fazia.
Ninguém se importou com o pedido dele. Então ele tomou uma decisão radical: Não tomo mais leite, não precisa mais trazer leite para mim. E nunca mais tomou leite, nem puro e nem com café, durante mais de vinte anos.
No ano de 1966, meu pai, que estava morando no Estado do Espírito Santo, veio a São Paulo para participar da minha cerimônia de casamento. Dois dias depois do meu casamento, ele e meu irmão Abel, foram tomar o café da manhã em minha casa. Minha esposa, que não sabia da briga dele com o leite, preparou o café com leite e serviu. Ele tomou sem dizer nada.
Meu irmão Abel ficou surpreso, e perguntou, ué pai, o senhor tomou leite? Ele simplesmente respondeu, tomei.
Assim, meu pai se reconciliou com o leite vinte e sete anos depois da briga.
Adriano Pereira de Oliveira.
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